sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Exercícios de desassombro

Tempos sombrios. Suspenses no ar. Quando pensava que chegava um momento de distensão, renovam-se sombras, com novas e redobradas tensões. Mas a saudade da cozinha é maior. Tempos nervosos me afastam dela. Se sombreia a alma, desanda a comida, a apreensão rouba-lhe o sabor. Na cozinha, sinto quando chegam esses sinais. Mas a paciência me ensinou a respeitar os tempos para poder voltar a ela e, entre panelas, formas e talheres, encontrar a medida dos desassombros. Relação visceral com a cozinha. Afasto-me dela quando estou triste ou preocupada. Mas é nela que saio da tristeza ou do estado de preocupação imobilizadora (e passo para a boa e esclarecida preocupação).

É o que estou a fazer. Praticando o meu melhor exercício de desassombro: cozinha. Ajuda a clarear a mente. E após um período relativamente estendido de afastamento, nada melhor do que retornar com uma aventura gastronômica. Cheguei, enfim, ao desafio, por anos adiado, de fazer uma sachertarte. Receita da terra de Mozart, muito badalada por aquelas bandas. Consta que era a sobremesa preferida de Freud.

Comecei hoje. Amanhã termino a receita (é para ser feita de um dia para outro). Darei notícias dessa empreitada. Mas confesso que só de ver a massa tomando corpo já deu uma sensação boa... Manteiga com açúcar, ovos, chocolate derretido, farinha. Tudo se transforma.


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